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Por que não há paz agora?



Originalmente publicado em 30/07/2013, no Conexão Israel


No dia 25 de julho de 2013 fui à estação de rádio Kol HaShalom, localizada no bairro de Sheik Jarrah (em Jerusalém Oriental) conversar com Moshe (Mossi) Raz, ex-presidente do movimento Paz Agora e ex-parlamentar pelo Meretz. A entrevista ocorreu agradavelmente no estúdio da rádio dirigida por Raz, e pudemos afinar algumas questões.


Nascido no ano de 1965, Raz passou sua infância e juventude em Jerusalém. Hoje reside na cidade de Shoham, é casado e tem dois filhos. Formou-se em economia e contabilidade pela Universidade Hebraica de Jerusalém, quando foi presidente do Conselho da União dos Estudantes da mesma universidade.


Raz foi oficial do exército, quando serviu como comandante das forças especiais Maglan. Retirou-se como tenente, e serviu às forças armadas como reservista até o ano de 2010.

Foi secretário do partido Meretz (1992-94), Presidente do Movimento Paz Agora (Shalom Achshav) (1994-2000) e diretor da Organização Ir Shalem (Cidade Inteira).


Foi eleito para a Knesset pela primeira vez no ano 2000, com apenas 34 anos. Fez parte das Comissões de Finanças e de Meio Ambiente.


Após o seu mandato serviu como vice-diretor do Seminário Educacional Givat Chaviva, diretor da Coalizão Pela Paz e tornou-se diretor de negócios da rádio Kol HaShalom (Voz da Paz), que realiza programas com canções em árabe e em hebraico e possui uma agenda voltada à coexistência. Em 2009 foi um dos fundadores do movimento Transporte Público Hoje e Amanhã. Entre 2007-2011 foi Secretário Geral do Meretz. Em 2010, tornou-se presidente do movimento Vida e Meio Ambiente, espécie de central de todos os movimentos ecológicos do país. Mossi Raz, hoje, ocupa o oitavo lugar na lista do Meretz e é o segundo suplente do partido.

 

Olá Mossi Raz, bom dia. Começaremos a entrevista falando sobre o conflito e a perspectiva de retorno às negociações de paz. Você atua e atuou em movimentos pacifistas e da esquerda sionista, como o Meretz e o Paz Agora (Shalom Achshav). Como você avalia o processo de paz nos últimos anos, e quais as razões que você aponta para que não tenhamos progredido nos últimos tempos?

Bom dia. Veja, eu penso que nenhum dos dois lados fez o que havia de ser feito para que chegássemos à paz. Principalmente o lado israelense. Para o lado israelense é muito difícil. Apesar de ter muita força, apesar de estar em uma posição de superioridade em relação aos palestinos - e isso é algo que temos que levar em consideração. Para chegar à paz com os palestinos, é necessário que se faça alguns sacrifícios difíceis, como, por exemplo, abandonar as suas casas e transformá-las em território palestino. Isto é quase que incompreensível para a maioria dos israelenses. Por isso eu penso que de todos os primeiros-ministros do passado, nenhum estava apto a chegar a um acordo, e nos últimos cinco anos não houve sequer negociações. E mesmo quando há negociações… quer dizer, se amanhã Netanyahu reiniciar novas negociações, eu não acho que o objetivo será alcançar uma solução definitiva. Pode ser que o objetivo destas negociações para Netanyahu seja diminuir a pressão internacional sobre Israel e dizer no final: “Não há um partner”, como fizeram no passado Barak e mais discretamente Ehud Olmert.


Já que você tocou neste ponto, em breve recomeçarão as negociações entre Israel e a Autoridade Palestina. Como você vê as participações dos EUA e da União Europeia, que recentemente passaram a participar mais das conversas, cada um da sua maneira? Você acha que desta forma é possível que se chegue a um acordo de paz?

Eu acho que o mundo precisa estar envolvido nestes esforços. Eu não vejo um caminho para que Israel e os palestinos cheguem à paz sem a participação da comunidade internacional, eu acredito que as negociações não chegariam a nenhum lado. Não temos representantes em Israel prontos para que se chegue a um acordo desta forma. E eu acredito que chegou a hora de termos um árbitro internacional. Voltemos à criação do Estado: eu acho que se uma comissão britânica tivesse entrado em negociações com Ben-Gurion em 1947 sobre as fronteiras do Estado de Israel, eles jamais teriam conseguido chegar a um acordo. Até os dias de hoje não existiria Estado de Israel. Mas eles foram um pouco mais corajosos do que isso. Disseram à ONU: “Decidam”. E a ONU decidiu. E eu acho que chegou a hora de uma decisão de um árbitro internacional. Talvez o presidente dos EUA e outras três pessoas. Talvez os EUA junto à Europa. Todos sabemos o que eles decidirão no final. Eu acho que a maioria concordaria com esta decisão.


Excluindo o governo israelense da questão, sabemos que há algumas questões problemáticas que representam um impasse para que se chegue à paz. Eu posso listar três, e fique à vontade para rejeitá-las ou acrescentar se quiser: as fronteiras do futuro Estado Palestino (incluindo os assentamentos judaicos), a possível divisão de Jerusalém e o tema dos refugiados palestinos. Qual seria a sua solução para a resolução destas questões?

Eu acho que a Iniciativa de Genebra nos dá uma solução muito melhor do que a que qualquer um de nós poderia dar (leia mais sobre a proposta da Iniciativa de Genebra aqui). As fronteiras seriam baseadas nas fronteiras de 1967, na qual a maior parte das colônias seria incorporada ao Estado de Israel e em troca os palestinos receberiam um território equivalente. Desta forma poderiam permanecer os cidadãos judeus de Jerusalém em suas casas, tal qual a maioria dos colonos. Jerusalém Oriental seria a capital do Estado Palestino. Assim como disse Clinton: “o que é palestino para os palestinos, e o que é judaico para os israelenses”. Em relação ao direito de retorno, há um tipo de solução na qual Israel receberia um número simbólico de refugiados, e todos os outros refugiados poderão voltar à Palestina.


Você pensa que o lado palestino concordaria com esta solução?

Eu acho que existe do lado palestino uma maioria – não ampla – que está apta a aceitar esta proposta. Eu acho que em Israel há uma minoria considerável – de quase 50% - que está disposta a aceitar a esta proposta, e nós precisamos fazer um pequeno esforço para que esta minoria passe a ser maioria, e aí talvez conseguiremos convencer o nosso primeiro-ministro a seguir este caminho.


Eu percebi até agora que você concorda que temos um partner do lado palestino que é a Autoridade Palestina (AP), e que nós podemos negociar com eles e chegar a um acordo. Mas como poderemos ter certeza de que um acordo com a Fatah (grupo que hoje comanda a AP) nos trará paz se eles e o Hamas não são unidos, não estão de acordo, e cada um controla o seu território?

Primeiramente eu penso que nós não podemos nunca ter certeza de nada. Podemos ter certeza do que aconteceu no passado. Sobre o que aconteceu no passado eu tenho certeza. Eu, por exemplo, tenho certeza de que Israel, desde que conquistou os territórios (Faixa de Gaza e Cisjordânia), há muito menos segurança, o número de israelenses que foram mortos aumentou, a relação de Israel com a comunidade internacional se deteriorou, e o mais importante: nós cometemos atos criminosos. Digamos que eu não gostaria que meus filhos se comportem assim. E eu acho que disso nós temos certeza. Se eu tenho certeza se teremos paz ou não? Eu não tenho certeza. Mas, mesmo que não tenhamos paz, ainda apoiarei que Israel dê fim à ocupação dos territórios. Mesmo que não haja paz – e repare que eu não disse que não haverá paz – eu não estou certo de que haverá paz. Mas ainda que não tenhamos paz, o fim da ocupação é preferível à ocupação. Porque assim nós seremos um país mais ético, um país mais seguro e um país mais bem aceito pelo mundo. E eu vejo que todas as vezes que desocupamos territórios, nos fortalecemos. E todas as vezes que ocupamos, nos enfraquecemos. Há aqueles que dizem que desde o Plano de Desconexão (quando Israel se retirou da Faixa de Gaza, em 2005) não devemos nos retirar dos territórios. Eu não aceito este argumento. Primeiro porque a Desconexão aconteceu sem nenhum acordo com o outro lado, e isto muda a situação. Mas mesmo assim, desde que nos retiramos de Gaza há uma grande diminuição no número de mortos israelenses nas fronteiras com Gaza. Parece que já nos esquecemos que os colonos eram explodidos pelos ares. Éramos obrigados a procurar as pernas dos seus filhos após as explosões. Soldados iam procurar pedaços pequenos dos corpos dos seus colegas que explodiam, para que fossem enterrados. Tudo isso teve fim. Todas as vezes que desocupamos territórios, conquistamos segurança. No Líbano, o mesmo. Todas as vezes que conquistamos territórios, perdemos segurança. Então, eu penso primeiramente em segurança e ética. Eu não sei se estou certo em relação à paz. Talvez conseguiremos paz.


É interessante o que você disse, porque ativistas da direita frequentemente apontam a retirada israelense de Gaza como algo que nos trouxe insegurança. E você diz que a Desconexão nos trouxe “menos insegurança” que antes.

Você pode examinar os números.


Você tem os números?

Eu não tenho os números mais atuais no momento, mas da última vez que eu os examinei – uma comparação entre os oito anos antes de sairmos de Gaza com oito anos depois (este ano) –, o número de mortos israelenses era 50% mais alto do que o atual. E agora nós estamos a alguns anos comparativamente muito tranquilos. Até mesmo na Operação Pilar Defensivo, o que não é nada bom, morreram três israelenses. Na Operação Chumbo Fundido morreram 12. Então, nós estamos falando dos últimos cinco anos, 19 ou 20 mortos, é muito menos do que antes.


Você foi oficial e combatente das Forças de Defesa Israelenses (FDI) e serviu como reservista até três anos atrás. Como você avalia que sua experiência como combatente nas FDI influencia a sua visão sobre o conflito? Você acredita que o alistamento militar deve ser obrigatório para todos?

Eu, pessoalmente, acho que deveríamos cancelar o alistamento militar obrigatório. É certo que quem esteve no exército geralmente é mais informado do que quem não esteve. Em Israel, há um fenômeno interessante: todas as pesquisas apontam, em geral, que os homens estão mais a favor da paz do que as mulheres. E ninguém compreende este fenômeno. As feministas em todo o mundo… as mulheres estão mais ao lado da paz. E nenhuma feminista aqui compreende este fenômeno. Eu tenho a explicação: os homens servem mais (tempo) o exército. Preste atenção que quase não há dentre os seis ou sete últimos comandantes do Shin Bet (Serviço de Segurança Geral) opiniões que não sejam desde o Meretz para a esquerda. Preste atenção nos generais da reserva, quase todos são de esquerda. Quanto mais o sujeito serve o exército, mais ele compreende que é impossível resolver este problema com a força. A força não ajudará. Mas eu ainda não sugiro que obriguemos ninguém a ir ao exército, eu acho que chegou o momento, na Israel de hoje, que é um Estado forte, seguro, em um momento em que seus inimigos estão ocupados com outros problemas… já não estamos mais em 1948. Eu acho que chegou a hora de cancelarmos o serviço militar obrigatório. O exército é suficientemente inteligente e bem equipado para que as pessoas se alistem por iniciativa própria, como voluntários. Eu vejo pelo meu filho: ele hoje é soldado e eu estou bastante seguro de que, caso não houvesse uma lei de alistamento obrigatório, ele seria soldado da mesma forma. Isso porque o exército dá a opção de uma carreira ligada à tecnologia e outros caminhos interessantes. Ontem também eu dei uma carona a outra soldada junto a ele para a mesma base, e perguntei a ela: se não houvesse alistamento obrigatório, você serviria o exército? Ela me disse que sim. Então eu penso que o exército e o Estado de Israel já são muito fortes para que isso aconteça.


Passamos agora um pouco para a política. Vimos que nas últimas eleições houve um crescimento de partidos de esquerda, como o Meretz e o Partido Trabalhista, mas ainda não foi o suficiente para que formem o governo. Como você explica esta crise da esquerda israelense, que desde os anos 1990 não é forte o suficiente para governar o país?

Veja… (respira) é difícil voltar à mentalidade de 1992, quando estamos no ano de 2013. Houve, eu diria, três motivos principais para o enfraquecimento da esquerda: a primeira e mais importante é a questão demográfica. Se você analisar até o ano de 1992, qual segmento da população votava na direita, verá que são justamente os segmentos que mais trouxeram crianças para o mundo. Os ultra-ortodoxos, os colonos, os religiosos, os tradicionalistas. Se você analisar quem votava na esquerda, perceberá que eles são mais dispersos. Hoje mesmo saiu na (revista) The Marker uma pesquisa interessante, que mostra que nos bairros em que a média era de menos de uma criança por casa, o Meretz teria 35 assentos na Knesset. Quer dizer, quem vota na esquerda quase não faz filhos, enquanto os eleitores da direita fazem muitos. É uma razão demográfica significativa, mas que junto a ela você deve acrescentar outros dois fatos: desde 1992 vieram a Israel quase 1,5 milhão de pessoas, dos quais a maioria vota na direita.


Você está se referindo aos imigrantes da ex-URSS?

Sim. E o outro fato que fortalece a direita é o de que a população árabe israelense, que tradicionalmente votava no Partido Trabalhista e no Meretz, hoje vota em partidos árabes. Então, a primeira razão é a questão demográfica, um motivo enorme, e que após tomar conhecimento dele você pensa: “Um momento! Então como é possível que ainda haja esquerda?” A segunda razão é o enfraquecimento da esquerda socialista em todo o mundo. Fora, talvez, na América do Sul, onde isto talvez não seja tão relevante, como o Brasil, mas foi sim em toda a Europa. A esquerda social-democrata está mais fraca do que nunca. Veja o que acontece com o Partido Social-Democrata na Alemanha, por exemplo, que teve menos de 20% nas eleições. Veja o que aconteceu com o Partido Socialista na França, que chegou somente ao terceiro lugar no parlamento europeu. Veja o que acontece com o Partido Trabalhista Britânico, que quase foi ultrapassado pelos liberais. Os partidos social-democratas em todo o mundo estão fracos hoje em dia, pois o mundo vêm se tornando mais capitalista, as pessoas não acreditam na nossa social-democracia… isso diminuiu (enfatiza) um pouquinho em 2011, por isso o Meretz e o Partido Trabahista cresceram um pouco. Isso é uma causa pela qual as pessoas votam na direita, e também é uma causa pelas quais pessoas que apoiam o campo da paz têm votado em partidos capitalistas do campo da paz, como o Kadima e o Yesh Atid, e aí acontece que eles não trazem benefícios para o campo da paz, por cooperarem com governos de direita. E o terceiro motivo, que é o menos importante dentre os três, é que há uma decepção com o lado palestino. Em 1992, e também em 1999, havia uma esperança de que poderíamos chegar a um acordo de paz com os palestinos. Hoje muitas pessoas perderam esta esperança.


Passemos agora um pouco para os movimentos nos quais você atua, ou trabalhos que você executa. Primeiramente falemos sobre o movimento Paz Agora. Qual a diferença do Paz Agora dos anos anteriores, em especial nos anos 1980, quando era um movimento com grande número de militantes, ou nos anos 1990 quando você foi o seu presidente, que igualmente era um grande, para os dias de hoje? Por qual processo o movimento passou para que tenha se reduzido tanto? Tem a ver com o que você disse agora?

Sim, por suposto. É a principal razão, a decepção com os palestinos, a questão demográfica… o fato é que o tema do conflito árabe-israelense simplesmente desapareceu dos meios de comunicação no país. Se você abrisse o Haaretz há 10 ou 11 anos, daria de cara com seis ou sete páginas sobre o conflito Israeli-palestino e outras quatro páginas sobre a economia. Se você abri-lo hoje, verá meia página sobre o conflito e outras 64 páginas sobre economia. E isto é o Haaretz! Para Yediot Achronot, Maariv, Israel HaYom, não há palestinos. O segundo motivo é que o Paz Agora, eu acho, em tempos de crise, certamente não agiu da maneira correta. O movimento saiu para se manifestar durante a 2ª Guerra do Líbano (2006). Depois de 30 dias ele se manifestou, deveria ter se manifestado desde o princípio. Saiu para se manifestar contra a Operação Chumbo Fundido em 2008 depois de duas semanas, quando deveria ter se manifestado depois de uma semana. Eu penso que estas posturas enfraqueceram o Paz Agora, o movimento gaguejou um pouco.


Frequentemente ativistas de direita acusam o Paz Agora de receber doações de países árabes e até mesmo de grupos terroristas. Por que temos acesso a este tipo de acusações e quase nunca vemos a resposta do Paz Agora? As acusações são verdadeiras?

Em primeiro lugar, todas estas acusações são mentirosas. É óbvio que o Paz Agora não recebe dinheiro de nenhum país árabe, muito menos de organizações terroristas. Mas sim, há um problema: a mídia israelense é muito aberta para a direita radical e a suas acusações que não procedem. Os colonos organizam as suas atividades políticas e são bancados pelo Estado de Israel. Por quem é financiado o Conselho de Yesha (Conselho de Judeia e Samária, o lobby dos colonos)? Quem financia as suas manifestações? O Estado de Israel. Através dos impostos que pagamos, do IPTU que pagamos. Eu disse uma vez, nos anos 1990, que as manifestações que divulgaram as placas de (Itzhak) Rabin trajando o uniforme da SS foram fabricados, na verdade, por cidadãos israelenses, pelo Estado de Israel, pelo IPTU que eles recebem nos territórios… dizem que o Dia da Lembrança de Itzhak Rabin, que fazemos uma vez por ano, é apoiado e financiado de forma tal pela União Europeia… isto é um absurdo. O inverso é liberado.


Conte um pouco sobre a iniciativa que criou a rádio Kol HaShalom (Voz da Paz), sobre seus programas e qual o objetivo que tem esta rádio. Ela possui um objetivo político?

Não é exatamente um objetivo. Nós, logicamente, apoiamos a solução de dois estados com base nas fronteiras de 1967, a iniciativa da Liga Árabe e todas as opiniões políticas que visam auxiliar essa ideia. A rádio Kol HaShalom tem duas ideias centrais: uma é a de que israelenses e palestinos podem trabalhar juntos diariamente. Isto talvez aconteça em outros lugares, mas eu não conheço nenhum onde isto se dê como aqui. Compreenda que isto aqui funciona com dezenas de voluntários que diariamente cooperam, um com o outro. E nós também temos parcerias com outras organizações, como Cities of Peace, Kids for Peace, e outras. O segundo objetivo, na realidade, é tentar difundir a voz da mídia de forma diferente. Os meios de comunicação, eu acho que conceitualmente, são unilaterais. Por que a mídia é unilateral? É unilateral porque se ela fala hebraico, fala para os israelenses. Se fala árabe, fala para os palestinos. Para os israelenses, ela fala o que os israelenses querem escutar. E para os palestinos ela fala o que os palestinos querem escutar. Assim acontece quando, por exemplo, eu recordei quando começou a Operação Chumbo Fundido: por 50 dias os palestinos dispararam no sul de Israel. Todos os dias caíram foguetes. E em Israel, todo tempo diziam: “os palestinos nos disparam, os palestinos nos disparam! Vejam as fotos das casas destruídas!”, e por aí vai. E então não há mais nada. Não se explica este tipo de coisa. E aí Israel reage com a sua operação, e em um dia morrem 220 pessoas. E os palestinos não compreendem: “Por que nos atacaram?” Eles não sabem! E o que escreve o Yediot Achronot sobre estes ataques? Logicamente o título não é “220 palestinos mortos”, mas sim “250 mil israelenses sob ataque”. Isto significa que nós somos sempre as vítimas e eles são sempre os agressores. Isto acontece nos dois lados. Tanto os israelenses quanto os palestinos recebem diariamente uma educação que diz que eles são os coitados, eles são as vítimas, e os outros só querem matá-los. Desta forma é impossível viver. Eu darei outro exemplo: eu observei as notícias do Canal 2 no dia 19 de novembro de 2012, durante a Operação Pilar Defensivo. Neste dia, nenhum israelense foi ferido. Durante 30 minutos só foram televisionados ruas destruídas, carros destruídos, apartamentos destruídos, o quanto sofrem os israelenses, e a necessidade de responder, e etc. Você certamente sabe do que eu estou falando. Por 30 minutos. No trigésimo minuto passaram a noticiar sobre Gaza por 30 segundos. E disseram: “hoje em Gaza morreram 20 palestinos, dos quais dez eram civis e cinco eram crianças”. Eu enfatizo esta expressão: estes 20 palestinos não se equivalem nem mesmo a um carro israelense. Estas cinco crianças não equivalem nem mesmo ao pneu de um destes carros. Essa é uma questão da comunicação israelense, mas que acontece também do lado palestino. Isto é o que nós tentamos consertar. Mas veja: nós somos fracos, somos pequenos. Mas quais vantagens nós temos sobre os grandes meios de comunicação? Antes de tudo aqui, há mais palestinos do que em qualquer outro canal da mídia israelense. Ainda que sejam voluntários, assim como eu, aliás. Mas eles estão aqui. Por algumas horas do dia, ou alguns vêm por algumas horas na semana. E passam as suas mensagens. Nós os escutamos e os divulgamos. E traduzimos para o hebraico e vice-versa. Este é o esforço que nós fazemos para que os dois lados se escutem, compreendam o outro e passem a se colocar do lado oposto. Nós ficamos sabendo sobre o conflito através do Porta Voz do Exército. Ele mente? Claro que não! Mas ele simplesmente não fala árabe. E sem compreendermos o outro idioma, torna-se difícil compreender o outro. O nosso esforço é para que cada um possa escutar o outro lado, da forma como o outro quer se expressar, e desta maneira derrubaremos a moral de vítima, vilão, e etc.


Para encerrarmos, há alguma mensagem que você queira mandar aos brasileiros que tiverem acesso com esta entrevista?

Sim. Eu gostaria especialmente de pedir a ajuda dos brasileiros. Quem estiver de acordo ou apenas um pouco conectado com a nossa causa, gostaria de dizer que estamos abertos à ajuda. Para os que quiserem ajudar financeiramente, seria de bom grado, mas não é a isso que me refiro. Eu gostaria que os brasileiros nos ajudassem politicamente. Como? Em primeiro lugar, pressionando o governo brasileiro, que cada vez ganha mais reputação internacional, para se manifestar de forma significativa no processo de paz. E finalmente, que promovam o diálogo na sociedade. Que falem para as pessoas sobre o que está acontecendo aqui, que tentem juntar as comunidades judaica e palestina - ainda que pequena - no Brasil a fim de chegar a um consenso, e que ambos atuem de forma conjunta. A paz aqui precisa da ajuda do resto do mundo, e o Brasil pode ser muito útil.


Obrigado! Foi um prazer.

O prazer foi todo meu!

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Foto de capa: Deputado Mossi Raz em uma manifestação em Sheikh Jarrah (11/03/2022). Own Work, foto de Shay Kandler


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