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O que é o Catargate?

  • 26 de mar.
  • 7 min de leitura
  1. O que é o Catar Gate?

O QatarGate é uma escândalo político no qual membros do gabinete do primeiro-ministro Netanyahu são investigados por prestar serviço para melhorar a imagem do Catar perante a sociedade israelense.


  1. Quem são os acusados?

Os quatro investigados cujos nomes foram revelados são assessores ou ex-assessores do primeiro-ministro Netanyahu.


  1. Eli Fedelstein era assessor de relações públicas de Netanyahu. Foi oficial do departamento de relações públicas (porta-voz) das FDI, até que terminou seu serviço e entrou para a reserva. Havia sido lotado no gabinete do deputado Itamar Ben-Gvir, e passou a exercer funções no gabinete do primeiro-ministro. Fedelstein não passou na inspeção de segurança, condição para assessorar o primeiro-ministro, e sua contratação foi travada. Ele, então, passou a assessorar Netanyahu extra-oficialmente, sem contrato formal de trabalho (supostamente de forma voluntária), e participava de reuniões que envolviam o mais alto escalão das forças de segurança e informações confidenciais.

  2. Yonathan Urich é um assessor de longa data de Netanyahu, também foi preso preventivamente pelo Shin Bet pela mesma razão e segue sendo investigado. Além disso, ele teve tornada pública pelo jornal Haaretz sua participação na campanha pela melhoria da imagem do Catar em 2022, no contexto da Copa do Mundo de futebol (quando Netanyahu era o líder da oposição). 

  3. Israel “Shrulik” Einhorn foi por diversas vezes conselheiro estratégico e coordenador de campanha de Netanyahu, que nos últimos tempos tem atuado como conselheiro do presidente da Sérvia, Alexander Vucic. Atualmente ele vive no país balcânico.

  4. Ofer Golan foi coordenador de campanha de Netanyahu e porta-voz de sua família.


  1. Os envolvidos têm algum histórico em outros casos no passado?

Sim.


Fedelstein, Urich e Einhorn são alvos de outra investigação, pelas quais Fedelstein e Urich foram presos preventivamente pelo Shin Bet (Einhorn teve pedido de prisão pedido, mas se encontrava na Sérvia), e nas quais são acusados de vazar para órgãos de mídia estrangeiros (no caso, o jornal alemão Bild) informações confidenciais, cuja publicidade, segundo as FDI, colocava em risco as vidas de reféns. Fedelstein sequer tinha permissão para que obtivesse o conhecimento dessas informações, uma vez que eram classificadas e ele não possuía um cargo que lhe desse acesso às mesmas. Einhorn é amigo pessoal do editor do Bild, enquanto Urich teria estabelecido o contato com o diário britânico Jewish Chronicle. No caso, a informação vazada era um suposto documento do Hamas, encontrado na Faixa de Gaza, com instruções de manipulação da opinião pública israelense a fim de pressionar Netanyahu a fazer um acordo com o grupo.


Ofer Golan foi acusado de assediar Shlomo Filber, ex-CEO do ministério das Comunicações e naquele momento, delator premiado no caso de corrupção envolvendo Netanyahu (Pasta 4000 - leia mais aqui).



  1. Qual é a acusação?

Desde o fatídico 07 de outubro, o Catar teria intensificado suas ações de propaganda, a fim de melhorar a sua imagem, sobretudo buscando se diferenciar da barbárie dos atos executados pelo Hamas, com quem o regime tem afinidade. O Catar dá asilo político a parte significativa dos líderes do braço político do Hamas, a família real é a dona da rede Al-Jazeera (acusada em Israel de ser pró-Hamas e de divulgar fake news contra Israel) e executou pagamentos - com o consentimento do governo israelense - ao grupo palestino, de forma constante, durante anos.

A imagem do Catar na sociedade israelense é de um país que apoia o terrorismo, com quem Israel não tem relações diplomáticas, embora não haja um estado de guerra entre ambos, e o Catar não é considerado um país inimigo. Se por um lado, há um forte discurso de políticos e personalidades públicas referindo-se ao Catar como um corpo que atua contra os interesses de Israel, por outro há israelenses que fazem negócios no país.


O não estado de guerra não significa que possa haver uma acusação de traição à pátria. Por ora, o que se investiga é a possibilidade de um conflito de interesses, uma vez que membros do governo, com acesso a informações privilegiadas, estavam a serviço de outro país. A investigação também averigua se o primeiro-ministro Netanyahu está envolvido no caso, se tinha conhecimento da dupla filiação de seus assessores, e se obteve algum benefício da situação. Até agora não foram tornados públicos indícios da participação direta do primeiro-ministro.


A imprensa israelense sabia que Fedelstein trabalhava para o primeiro-ministro Netanyahu, e, a cada entrevista coordenada ou informação repassada, a compreensão era a de que as informaões trazidas por ele tinham origem no gabinete do primeiro-ministro, quando, na realidade, em diversas ocasiões podem ter saído de Doha.


  1. Como os acusados teriam atuado?

Fedelstein teria atuado de diversas formas em prol da melhoria da imagem do Catar em Israel.

  • Coordenar junto a jornalistas o repasse de informações, sempre ressaltando a enorme contribuição do Catar em prol da libertação dos reféns.

  • Organizar a agenda de entrevistas de Jay Futlik em Israel (Ravid Druker).


Já os meios de atuação de Urich e Einhorn eram, segundo o jornal Haaretz, um pouco mais complexas:

  • Einhorn teria criado o site Perception, através do qual divulgava, em conjunto com o site israelense Coeus, notícias (aparentemente manipuladas) que exaltavam o Catar (projeto Lighthouse)

  • Foram levantadas ao menos 20 perfis no Twitter que se dedicavam sobretudo a ressaltar os esforços do Catar na luta por direitos humanos em Gaza, exaltando sua atuação durante a pandemia, ou a organização da Copa do Mundo, compartilhando informações de sites fabricados como o Worldwide & Business News e o próprio Coeus.

  • Após a guerra, com a deterioração da imagem do Catar em Israel, Urich teria usado seu canal e recomendado ao governo do Catar mostrar-se como o principal interlocutor pela libertação dos reféns, a fim de mudar a percepção popular.


Sobre Ofer Golan, ainda não está claro de que maneira ele teria atuado.


  1. Como a informação veio a público?

Em novembro de 2024, o jornalista Guy Peleg, do Haaretz, trouxe a informação de que Urich havia trabalhado no site Perception à serviço do Catar, em uma campanha de relações públicas para a Copa do Mundo de 2022. Urich negou. Em fevereiro deste ano, o jornalista Roee Yanovsky, do Canal 11, mostrou documentos que comprovaram a participação de Urich em uma campanha pela melhoria na imagem do Catar, o que foi novamente negado pelo assessor de Netanyahu.


Yanovsky também trouxe a informação de que Fedelstein estaria envolvido na mesma campanha, e apresentou documentos de transferências feitas por um intermediário nos EUA, através de Jay Futlik, um importante empresário estadunidense e que atua como lobista a serviço dos interesses do Catar. Questionado em uma reportagem do Canal 11, Futlik confirmou o pagamento a Fedelstein. A defesa de Fedelstein disse que o valor recebido nos EUA foi a forma momentânea encontrada por Netanyahu para remunerar seu assessor, mas Futlik reafirmou que o pagamento foi feito em virtude do trabalho feito pelo acusado com o objetivo de construir uma imagem positiva do Catar em Israel.


Ainda em fevereiro de 2025, o, jornalista Ofer Haddad, do Canal 12, divulgou que os quatro assessores de Netanyahu são investigados por coordenarem a campanha pró-Catar, inclusive durante o período em que trabalhavam no gabinete do primeiro-ministro. Diversas outras reportagens sobre o caso foram publicadas, trazendo mais documentos e testemunhas desta dupla atuação.


  1. Em que pé anda a investigação?

O chefe do Shin Bet, Ronen Bar, abriu uma investigação contra os quatro conselheiros no dia 09 de fevereiro deste ano. No início de março, foi decretada a proibição da divulgação de qualquer informação para que não atrapalhe a mesma. 


  1. Qual é a reação popular sobre a divulgação dessa investigação?

Por incrível que pareça, a reação foi tímida, embora possamos estar vivenciando um dos maiores escândalos de violação da segurança nacional da história de Israel. Há de se levar em conta que há seis anos há frequentes manifestações pela prisão de Netanyahu, réu em três casos de corrupção, e que se recusa a deixar o governo e se favorece de sua posição para a sua defesa.


Além disso, desde fevereiro de 2023, a população se manifesta quase que diariamente contra o golpe judicial implantado pelo governo de extrema-direita, que visa destruir o que restou das instituições democráticas do país se somaram aos protestos. Some-se a isso os protestos a favor de um acordo de cessar-fogo que traga de volta os últimos 59 reféns (dos quais calcula-se que 24 ainda estejam vivos), e que têm atraído as atenções e tem sido a prioridade da população no momento.


Deputados da oposição não dedicaram suficiente atenção ao Catargate, com raras exceções. Um dos que a encara como carro-chefe de sua pré-campanha é o general da reserva Yair Golan, líder do partido de esquerda Os Democratas. Golan, no entanto, não é parlamentar no momento, o que limita as suas possibilidades. Nem o líder da oposição, Yair Lapid, nem Benny Gantz, outrora mais popular representante do bloco de centro-esquerda, se aferraram ao Catargate e dão ao caso a importância devida.


  1. Qual foi a reação de Netanyahu e de seu governo?

Mesmo com a sociedade inerte e os líderes da oposição praticamente silenciosos frente ao escândalo, o governo demonstrou temer as consequências do caso. Entre as medidas adotadas inicialmente, houve um alinhamento do discurso, tanto de deputados e ministros, quanto de jornalistas e personalidades ligadas ao governo, de que o Catar não é um país inimigo e que não houve nada ilegal. Conforme a acusação foi ganhando corpo e trazendo componentes mais graves, o governo partiu para o ataque: Netanyahu anunciou a demissão do chefe do Shin Bet, Ronen Bar, que coordena as investigações do Catargate, alegando que não confia nele, e acusando-o de abrir a investigação somente para não ser demitido.


Por ora, a Suprema Corte proibiu a demissão e anunciou uma turma de três ministros para avaliar o caso no dia 8 de abril. O governo, que ameaçou não obedecer a decisão judicial, recuou e decidiu aguardar a decisão.


  1. Que consequências tal caso pode ter em Israel?

Em condições normais, um caso como este seria capaz de derrubar o governo em questão de dias. Há fortes indícios de conflito de interesses, violação à segurança nacional e dupla filiação de membros do mais alto escalão do gabinete do primeiro-ministro. Afinal, o governo israelense é uma força soberana ou atua segundo determinações de Doha? Qual a influência que o Catar tem nas decisões do primeiro-ministro? É possível que Netanyahu não soubesse que quatro de seus assessores trabalhavam para outro país, cuja posição é bastante controversa em Israel? Se sabia, estava envolvido? Se não sabia, não é uma mostra de fraqueza do primeiro-ministro?


Caso o governo não caia em função deste caso - o que parece, no momento, o mais provável -, quais serão seus próximos passos? Netanyahu demitirá Ronen Bar, caso as investigações avancem? Desobedecerá a decisão da Suprema Corte, criando a maior crise constitucional da história de Israel?


Os cenários traçados apontam para duas hipóteses extremas: a derrubada do governo e um golpe a céu aberto, cujas reações são imprevisíveis. Claro, há também a possibilidade de a investigação não causar grande frisson, tendo em vista a enorme capacidade do governo de criar factoides e cortinas de fumaça. Seguiremos acompanhando.


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