Originalmente publicado no Conexão Israel, em 24 de julho de 2017
Até que ponto Netanyahu está comprometido? Um guia sobre a dramática evolução dos casos envolvendo o primeiro-ministro e seus pares.
Benefícios recebidos de (Arnon) Milchan, conversas gravadas com (Arnon) Moses, a transação dos submarinos e a investigação sobre os alto escalão da Bezeq (empresa de telefonia, internet e TV a cabo) - os casos que se relacionam ao nome de Netanyahu e seus pares voltaram às manchetes. Qual é o peso das novidades? O que alega o primeiro-ministro em sua defesa? E o que é a Pasta 4000?
Tradução livre do hebraico, da matéria publicada pelo site do jornal Haaretz, em 16 de julho de 2017 (e atualizada em 18 de julho de 2017). Para ler o original, clique aqui.
Estamos ouvindo sobre as investigações já há um ano. O que realmente há de novo?
Em um período muito curto houve avanços em todos os quatro casos (de corrupção) ligados ao primeiro-ministro. Nas operações “1000” e “2000”, as suspeitas se fortaleceram. Nos casos dos Submarinos e da Bezeq, investigaram-se pessoas de alto-escalão, e dois confidentes de Netanyahu se encontram em prisão domiciliar.
Quais são as suspeitas na “Operação 1000”?
Netanyahu é suspeito de ter recebido agrados de magnatas, principalmente Arnon Milchan e James Packer: charutos, champanhe e jóias no valor de centenas de milhares de shekels. Recentemente foi reforçada a suspeita de que as relações eram de mão dupla: Netanyahu teria recebido os presentes de Milchan, e em contrapartida, suspeita-se que ele teria trabalhado para a venda do Canal 10, e outras negociatas relacionadas a telecomunicações.
Mas Netanyahu alega que teria somente recebido presentes de um amigo.
Na verdade, essa é a linha de defesa de Netanyahu. No entanto, as provas recolhidas pela Polícia sugerem que a oferta de charutos e champanhe foi sistemática, através de emissários que utilizavam codinomes, e sob demanda da família Netanyahu. Ao mesmo tempo, Netanyahu teria agido em favor de Milchan, gerando uma situação de conflito de interesses (entre o magnata e o próprio Estado).
E o que seria a “Operação 2000”?
Na “Operação 2000” há gravações de Netanyahu negociando suborno com Noni (Arnon) Mozes, dono do jornal Yediot Ahronot (e do site Ynet e do Canal 10 de televisão). O negócio: o jornal faria coberturas pró-Netanyahu, que em troca usaria sua influência para devolver ao Yediot Ahronot a hegemonia do mercado de mídia impressa (o jornal hoje é o segundo mais lido do país, atrás do Israel HaYom - distribuído de forma gratuita). O método: Netanyahu tentaria promulgar uma lei contra o jornal Israel HaYom, ou convenceria a direção do Israel HaYom a diminuir a distribuição.
Mas Netanyahu alega que ele não tinha a intenção de implementar o acordo?
Este é o ponto crucial. Netanyahu argumenta que ele estava fingindo, e que as negociações eram blefe. O procurador-geral acusa o primeiro-ministro, e diz que há evidências de que Netanyahu agiu para implementar o acordo. O desenvolvimento: o proprietário do jornal Israel HaYom, Sheldon Adelson, testemunhou que Netanyahu havia lhe relatado as conversas com o Yediot Aharonot. Se Netanyahu só estava blefando com Moses, por que envolver Adelson na história?
E como se dá o desenvolvimento do Caso dos Submarinos (Operação 3000)?
Na “Operação 3000”, foram presas pessoas do alto escalão (do governo) por suspeita de suborno e fraude. Ao checar se o caso envolve Netanyahu, a questão é simples: o advogado David Shimron, homem de confiança do primeiro-ministro, também representa o agente da empresa alemã (Thyssen Krupp - que venderia os submarinos) em Israel. Se Netanyahu sabia que Shimron também representa a empresa alemã, haveria conflito de interesses. É importante ressaltar que Netanyahu e Shimron pressionaram a licitação (dos submarinos) para garantir aquisição junto aos alemães, apesar da oposição do Ministério da Defesa. Shimron sabia que Netanyahu tinha o mesmo posicionamento.
Mas Netanyahu diz que não sabia.
É certo. Por enquanto, o problema de Netanyahu não é evidência no Caso dos Submarinos, mas o quadro que emerge: pessoas ligadas a Shimron se encontram em prisão domiciliar. Outro suspeito, Avriel Bar Yosef, é o homem que Netanyahu queria como chefe do Conselho de Segurança Nacional. Outro homem de confiança de Netanyahu, Yitzhak Molcho, era um mensageiro de contatos políticos com funcionários do alto escalão na Alemanha. A aquisição de embarcações é um componente significativo em relações entre países. Molcho é sócio de Shimron. Em outras palavras: Molcho representa o primeiro-ministro de Israel na Alemanha, enquanto seu sócio representa um agente da empresa alemã. Por essas questões, é difícil acreditar na versão de Netanyahu, que diz não saber que Shimron estava na jogada.
Nota do tradutor: Boguie Yaalon, ex-ministro da Defesa, afirmou que Netanyahu bateu o pé para que fossem comprados mais submarinos do que o recomendado pela cúpula do Ministério da Defesa e do alto escalão das forças armadas. Ainda não há como provar que Netanyahu estava envolvido em uma negociata, mas Miki Ganor, representante israelense nas negociações com os alemães (um dos que tiveram decretada prisão domiciliar, suspeito de embolsar até 30 milhões de euros no caso), assinou um acordo de delação premiada após a publicação desta reportagem, que poderia comprometer o primeiro-ministro.
E agora o Caso Bezeq. É verdade que existe uma “Operação 4000”?
A “Operação 4000” é o codinome dado por jornalistas para os desenvolvimentos dramáticos no Caso Bezeq, resultantes da investigação da Reshut LeNiyarot Erech (literalmente “Autoridade de Ações de Israel”, entidade de regulação financeira responsável por controlar títulos de propriedade e crédito emitidos tanto pelo setor público, como por entes privados) e que foram publicados em um relatório da Controladoria do Estado. O auditor diz que Netanyahu não relatou sua amizade com o proprietário das empresas de telecomunicações Bezeq, Saul Elovici, e ao mesmo tempo tratou de 12 questões que afetam o monopólio. O auditor perguntou a Netanyahu duas vezes sobre suas amizades no mercado das telecomunicações, mas Netanyahu não mencionou o Elovici e Milchan. Em outras palavras: Netanyahu apresentou um falso depoimento.
E Netanyahu é suspeito no caso?
Ainda não, mas provavelmente ele será questionado no que diz respeito ao falso depoimento. Netanyahu afirmou nos últimos dias que entre ele e Elovici há "relações amistosas, não mais do que isso", e, portanto, não era obrigado a informar tais laços. No entanto, no passado ele argumentou em um documento apresentado ao um tribunal que Elovici “é seu amigo pessoal há 20 anos."
Qual é a ligação entre este caso e o site Walla (grande portal de notícias em Israel)?
Elovici não era apenas amigo de Netanyahu. Ele deu ao primeiro-ministro um serviço de imprensa tendencioso através do seu próprio site. Em outubro de 2015, Gidi Weitz revelou ao Haaretz de que maneira o site ocultou artigos críticos a Netanyahu, como manchetes foram alteradas, como dados positivos (ao governo) foram produzidos - tudo com instruções vindas de cima. Ao mesmo tempo, Netanyahu, que também acumulava o cargo de ministro das Comunicações, promoveu interesses de Elovici.
E quais são os avanços da investigação da Autoridade de Ações de Israel?
Após investigação do “Haaretz”, determinou-se que Netanyahu não trataria de assuntos ligados a Elovici. Quem continuou a tratar das questões de Elovici e Bezeq é o diretor do Ministério das Comunicações, Shlomo Filber, homem de confiança de Netanyahu, que foi chefe do Likud nas eleições. Suspeita-se que Filber, de forma sistemática, passou para a Bezeq documentos secretos. Filber receberia os documentos com modificações, e em vários casos estas modificações foram aceitos e se tornaram posições do Ministério das Comunicações. O fiscal indica a suspeita de que Filber usava as agências reguladoras para projetar leis e regulamentos com o objetivo de benefício próprio , como se fosse um agente da Bezeq no Ministério das Comunicações.
Digamos que as suspeitas contra Filber são corretas. Netanyahu está ligado a elas?
A resposta é longa: em 17 de maio de 2015, dois dias depois que o governo foi empossado, Netanyahu demitiu por telefone o diretor executivo do Ministério das Comunicações, Avi Berger. Berger realizou reformas na banda larga, que afetaria a Bezeq futuramente. No mesmo dia, comentaristas políticos afirmaram que o principal beneficiado com a demissão de Berger era Elovici. Após a demissão, Netanyahu nomeou Filber para o cargo.
E qual a resposta curta?
Netanyahu é o responsável por ter plantado o agente.
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Atualização: No dia 21 de novembro de 2019, Netanyahu tornou-se réu nas pastas 1.000, 2.000 e 4.000 (a pasta 3.000 ele não foi indiciado). Nas duas primeiras, Netanyahu é réu por fraude e abuso de poder. Na última pasta, a acusação é mais grave: é réu por suborno.
Outras evidências surgiram ao longo do tempo: uma gravação a mais com Noni Moses, que não sabemos se interferiram na decisão de Mandelblit. Na pasta 4.000, o atual ministro da Justiça Amir Ohana divulgou informações sigilosas, às quais acusavam a Polícia de coagir Nir Chefetz, ex-assessor de imprensa de Netanyahu, de depor contra o primeiro-ministro. Chefetz diz só ter dito a verdade.
Atualização 2: Durante o governo Bennett-Lapid (2021-22), foi estabelecida uma Comissão Investigativa para um novo inquérito sobre o caso dos submarinos (Pasta 3000). Na segunda-feira, 24 de junho de 2024, o premiê Binyamin Netanyahu, o ex-ministro da Defesa, Moshe Yaalon, o ex-chefe do Mossad, Yossi Cohen, além de outras duas pessoas, receberam cartas de advertência, alegando que o relatório da comissão pode afetá-los duramente. No caso de Netanyahu, a comissão alega que há fortes indícios de que sua ação tenha causado danos na segurança do país, nas relações diplomáticas e nos seus interesses econômicos.
Foto de capa: Nir Hirshman (ניר הירשמן) / Nir Hirshman Communication / CC BY-SA 4.0
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