Originalmente publicado em 29/11/2016, no Conexão Israel
Há quase uma semana um incêndio de grandes proporções ameaça Israel e os territórios ocupados. Dezenas de milhares de pessoas foram evacuadas de suas casas por conta do perigo, principalmente na região noroeste do país, onde se encontra Haifa, a terceira maior metrópole de Israel. No entanto, os incêndios não atingiram apenas esta região (confira o mapa abaixo): a área de Jerusalém, o litoral central do país e outras também foram afetadas pelo fogo. Arredores de Ramallah e Nablus, cidades palestinas no norte da Cisjordânia, onde não há muitos assentamentos judaicos, também foram afetados.
É necessário recordar que o clima favorece incêndios como o atual. Neste exato momento, países como Egito, Líbano e Turquia sofrem com uma incidência ainda maior de incêndios em comparação com Israel e Cisjordânia. O mesmo acontece na Grécia, no Chipre, na Síria e no Iraque. Cabe recordar que o grande incêndio na Galileia, no ano de 2010, ocorreu no mês de dezembro. Os ventos secos e quentes, aliados à falta de chuva são algumas das condições que facilitam a expansão do fogo em áreas verdes do país, como o Carmel.
O que desta vez parece ser distinto é que parte dos incêndios pode ter sido causada por terroristas, de forma intencional. Segundo o diário Haaretz, a polícia israelense já prendeu 23 suspeitos, e o Exército de Defesa de Israel (Tzahal), outros 10; estes últimos estão sendo investigados pelo Serviço Secreto - Shabak. Segundo o site Ynet, dois deles já foram identificados como simples ladrões, sem relação com o incêndio, e outros dois teriam admitido participação dos incêndios, segundo fontes não oficiais do gabinete. De acordo com o Haaretz, o Ministério da Segurança Pública acredita que a metade dos incêndios tenha sido causada por “questões de fundo nacional” (em outras palavras, “terrorismo palestino”). Entretanto, nenhum grupo admitiu a autoria dos incêndios.
Por outro lado, as palavras do ministro da Segurança Pública, Gilad Erdan (Likud), são um tanto estranhas. Se a metade dos incêndios foi realmente causada por terroristas, como ele afirma, estamos falando de uma “megaoperação terrorista”, de acordo com a parlamentar Zehava Galon, líder do oposicionista Meretz. E se a inteligência do exército, tão eficiente que é, não detectou uma operação terrorista desta magnitude, todo o país deveria estar comentando sobre esta falha gigante. Em outras palavras, se o incêndio é de fato uma megaoperação terrorista, por que todos os meios de comunicação, analistas e cientistas políticos não estão neste momento falando sobre este gravíssimo erro? Seria o maior episódio de negligência da Inteligência (ou do governo) desde a Guerra de Yom Kipur, o que não é pouca coisa. Tudo isso nos faz questionar este “mega-atentado”, e relevar a participação terroristas nos incêndios. Aparentemente, houve sim ação terrorista, mas não com a dimensão que o governo tenta vendê-la. O mais provável é que, tal qual os esfaqueamentos do ano passado, as queimadas tenham sido feitas de forma espontânea por duas ou três pessoas.
Sabemos que o terror reinventa suas práticas constantemente, e não deveríamos ficar impressionados com mais uma ação criminosa criativa. Destruir é muito mais fácil que construir, e mais ainda quando o destruidor não tem que obedecer a nenhuma regra. O terror deve preocupar-nos (e muito), mas não menos que algumas das reações aos atos dos terroristas. Uma delas foi a comemoração do incêndio por grupos palestinos. De acordo com o website Walla, o hashtag “Israel está queimando” em árabe foi um dos mais repetidos na internet nesta semana. Rashid Alafasy, um imã do Kuwait, com mais de 16 milhões de seguidores nas redes sociais, ironizou o drama com um “boa sorte no incêndio”, ao lado de um emoji sorrindo. Outras publicações do tipo podem ser vistas na internet, comemorando a desgraça de civis israelenses.
Todavia, as reações negativas não vêm somente do lado árabe. Naftali Bennett (A Casa Judaica), ministro de Educação de Israel, publicou em sua página de Facebook que “somente aqueles a quem a terra não lhes pertence podem queimá-la” (foto abaixo), claramente referindo-se aos árabes, os quais já se cansou de repetir que não têm direito à Terra de Israel. Além do péssimo momento para fazer política barata e propagar discurso de incitação ao ódio (o que, vale ressaltar, jamais tem momento adequado), Bennett também foi incoerente (e desmascarado): um ativista de esquerda fez uma compilação de manchetes, nas quais colonos israelenses queimavam campos pertencentes a palestinos. Pronto! O incêndio se transformou em uma briga política.
Lamentável por lamentável, é sempre melhor uma visão positiva sobre o que está acontecendo: a Autoridade Palestina, tal qual em 2010, durante o incêndio na Galileia, enviou oito unidades de bombeiros para ajudar a apagar o fogo (foto). Mais de 10 países também enviaram aviões, bombeiros e todo o tipo de material para ajudar a controlar o incêndio (o que está funcionando em algumas regiões). O movimento kibutziano, como sempre, abriu as portas para que todos os desabrigados se refugiassem nos kibutzim de todo o país. Cidadãos israelenses (árabes, inclusive) fazem o mesmo. Há um forte sentimento de solidariedade nacional para ajudar os desabrigados neste momento tão difícil. O povo de Israel, em seus momentos mais complicados, sempre mostra solidariedade, e esta lição é muito mais importante do que disseminar o ódio e fazer política com a tragédia. Eu fico com o que de melhor acontece nestas horas: a ajuda entre os cidadãos em uma situação difícil como esta. Neste momento, a maioria escolheu ajudar o próximo, e não odiá-lo.
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Foto de capa: Um avião de combate a incêndio em ação em um incêndio na área de Mevo em Modi'im, 23 de maio de 2019. Fotografado da área industrial de Modi'in. Foto de Sayshal 2. One Work.
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