Originalmente publicado em 14/08/2018, no Conexão Israel
Tradução livre do artigo de Ilana Shtutland, publicado originalmente no site do diário Maariv em 13/08/2018 (feita por João Koatz Miragaya) - Leia o original aqui.
“As pessoas estão com o psicológico afetado, isso precisa acabar”. Líderes regionais do sul estão furiosos
Após mais uma rodada da última escalada de violência, no Otef Gaza (arredores de Gaza) não se adota facilmente os termos "calmaria" e "retorno à rotina". Agora, os chefes das autoridades locais estão falando sobre a situação dos moradores e decretando: "Dessa maneira é impossível continuar"
“O fato de que hoje está tudo calmo, para mim não diz nada. Isso não acalma, e até mesmo pode nos pegar menos preparados para um dia assim ou de outro jeito”, disse Gadi Yarkoni, prefeito do Conselho Regional de Eshkol. Yarkoni não está sozinho; os últimos dias de relativa calma no sul, que vieram após uma nova rodada de escalada de violência, não causaram um otimismo especial aos líderes regionais. “Nós tivemos aqui quase quatro anos de silêncio após a (Operação) Margem Protetora, quando nós já acreditávamos que estávamos nos preparando para uma mudança de longo prazo”, disse Yarkoni. “Mas de repente nos fizeram voltar àqueles 140 dias que nos devolveram à longa rotina de emergência, e durante este tempo tivemos quatro dias disparos como se não soubéssemos como é. Na rotina de emergência nós temos que nos comportar normalmente, as crianças precisam pegar os ônibus para a escola. Quando eles chegam na escola, a conversa do dia começa a ser que balão (para incendiar) era, o que estava preso nele, e que bola eles viram. Uma criança contagia a outra nessas conversas, e isso se transforma num fenômeno”.
Como conseguimos viver nessa realidade?
“A população não pode viver assim por muito tempo, e por isso nós nos direcionamos ao governo e dissemos: nós temos paciência para encarar uma dessas duas situações - ou vocês fazem uma operação militar assertiva que ditará a rotina da região, ou vocês chegam a um acordo deste ou daquele tipo com o Hamas, mas é impossível continuar numa rotina de vida como essa. Ninguém no mundo, ou ao menos no Estado de Israel, estaria de acordo com viver assim. Eu não sei se hoje teremos silêncio, eu não sei se hoje cairá um balão incendiário em uma das aldeias. E todos os dias vemos dezenas de incêndios em territórios abertos. Eles dizem que tudo isso é rotina, mas não dá pra continuar assim. Isso tem que parar”.
“É impossível dizer que voltamos à rotina”, esclarece Tamir Idan, prefeito do Conselho Sdot Neguev. “Balões e pipas incendiários são rotina? Porque os incêndios já haviam retornado aos nossos distritos na sexta e no sábado. Os manifestantes na fronteira que jogam granadas nos soldados e tentam furar a cerca, isso não é cessar-fogo nem rotina. Além disso, em relação ao assunto do cessar-fogo, eu pessoalmente não recebi nenhum aviso de cessar-fogo; e se houver um acordo sobre um cessar-fogo nestas circunstâncias e neste momento, este é um assunto muito sério, porque estamos atualmente estabelecendo uma situação em que o Hamas controla o fogo e o cessar-fogo, e se permite cobrar um preço por qualquer dano a terroristas, como eles declararam que fariam e cumprem com o prometido.”
“A realidade que nós vivemos não aparece em nenhuma definição do dicionário”, disse igualmente Yair Farjum, prefeito do Conselho Regional Hof Ashkelon. “Mesmo em uma situação que é definida como rotina, num instante saltamos para uma emergência. Esta situação que nós vivemos, que se baseia em que o Hamas vai disparar ou não, ou na vontade do Hamas de estabelecer que agora teremos uma situação de emergência e depois de três dias de rotina, não é lógica. Me parece que o Hamas realmente controla as nossas vidas, e é claro que isso não pode continuar assim”.
"As nossas vidas são complexas e cheias de surpresas”, acrescenta Alon Szuster, prefeito do Conselho Regional Shaar HaNeguev. “São complexas porque temos 17 anos de terror de tipos diferentes, após 44 anos de silêncio considerável na Faixa de Gaza. Esse terror te afeta física e mentalmente. E veja, apesar dessa realidade nos últimos 15 anos no Shaar HaNeguev - e isso representa corretamente o que acontece em todo o Otef - nós nos encontramos em crescimento demográfico e em um fortalecimento econômico. E isso também deve ser levado em consideração quando apresentam a situação como impossível. Eu conheço essa questão pessoalmente. Minha mulher trabalha em centros de vacinação em Sderot e no Shaar HaNeguev, e eu abraço todos os habitantes, os pais e os filhos, para quem é difícil viver trauma após trauma. Mas por outro lado, eu sou absolutamente consciente de que a situação também é difícil e dolorosa, e que não há uma solução simples”.
Situação Inconstante
No que lhes diz respeito, fica claro para os líderes dos conselhos que qualquer solução para a situação deve incluir o fortalecimento econômica e social na região. "Isso pode ser conseguido canalizando dinheiro para o Otef, por meio de programas de ação e desenvolvimento que atraiam pessoas para essa área, e que também ajudem àqueles que já estão aqui a respirarem", diz Yarkoni. “Infelizmente, ao invés de arregaçar as mangas para isso, o governo de Israel não faz nada. Eu conclamo o primeiro-ministro, os demais ministros e membros do gabinete: não pode ser que decidam pelo cessar-fogo e pelo investimento financeiro em Gaza, sem que haja investimento no Otef Gaza. Além disso, o Estado de Israel tomou uma decisão muito importante de construir unidades de segurança nas comunidades no Otef Gaza, mas essa decisão foi tomada pela metade. Da mesma maneira que não tomariam uma decisão de proteger somente meia cidade, hoje, metade do meu conselho tem abrigos blindado e a outra metade não. Isso precisa ser resolvido. Com 50 milhões de shekels esse assunto está terminado. A nossa população está pronta para enfrentar situações difíceis, porém para isso precisa dos instrumentos e de um objetivo. O nosso contato com as forças de segurança é diário, sem intermediários, e é excelente, e se no fim decidirem que permitirão que o IDF vença, o IDF saberá fazê-lo. Também estamos cientes de que, encabeçando cada solução formulada, deve haver o retorno dos soldados que nos protegeram com seus corpos e pagaram com suas vidas na (Operação) Margem Protetora; então, a nosso favor, devemos garantir que as vidas dos moradores de Gaza também sejam boas. Só assim teremos tranquilidade a longo prazo”.
"Nós dizemos ao governo: se vocês quiserem que haja um grupo completo de povoados e cidadãos que continuem a dar-lhes um tipo de tranquilidade para administrar as coisas sabiamente, então deve estar claro que um plano econômico abrangente deve continuar a ser executado em todos os povoados do Otef, e isso pode ser uma espécie de resposta à situação volátil pela qual estamos passando”, diz Farjun. “Nós apresentamos um plano ao governo, e não posso dizer que estamos recebendo uma resposta rápida e precisa. Precisamos fortalecer todas as comunidades envolvidas com um plano econômico, confiável e sustentável. Para que não passe um ano ou meio ano e venha ministro ou outra autoridade e nos diga: ‘é isso, comecem a andar sozinhos’. Também está claro para nós que o equilíbrio na equação foi completamente interrompido. O Hamas hoje aparentemente não tem nada a perder. Eles dizem: ‘Ramallah está contra nós. O Egito está contra nós. A situação econômica é horrível, os cidadãos estão enjaulados dentro de Gaza bloqueada’. O que eles têm a ganhar é capital político no mundo árabe extremista contra o Estado de Israel. A liderança do Hamas não sente nenhuma necessidade pessoal em fazer uma atividade radical para que haja tranquilidade, para beneficiar a sua população. O que pode criar uma situação na qual a liderança do Hamas sinta que ela deve agir de acordo com novas regras? Isso acontecerá quando ela estiver ameaçada no nível pessoal, e até mesmo seja atingida. Então eles começarão a perguntar a si mesmos se essas ações terroristas valem a pena ou não".
Restaurar a tranquilidade
"A nossa realidade definitivamente não é sempre confortável, mas eu peço para que acreditem nos habitantes que compram casas aqui, que vivem aqui, nos jovens que vêm à região, e nos adultos que desejam que seus netos e filhos venham viver conosco”, disse Szuster. “Isso acontece quando eles percebem que aqui tem problemas como em muitos outros lugares. Isso definitivamente não é cômodo, mas também não há necessidade de caluniar a região e dizer que é o inferno na terra. Aqui não é o inferno na terra. Existem aqueles que podem suportar esta realidade, e estou feliz que muitos escolheram viver conosco”.
Como se vive uma vida normal na região?
“A vida ao lado de Gaza é como se fosse uma vida com uma doença crônica, que somente uma mudança de política significativa dentro de Gaza dará um fim nisso. Quatro anos após a (Operação) Margem Protetora, nós nos encontramos dentro de um processo político estratégico com parceiros internacionais com chances específicas, realmente desconhecidas, para alcançar uma calma a longo prazo, devolver os prisioneiros e pessoas desaparecidas, e para restaurar a Faixa de Gaza”.
"Meu filho, que se alistará em breve, quase toda a sua vida ouviu sirenes de alerta vermelho e aprendeu a como deitar-se no chão e proteger-se. Ele cresceu de forma excelente, assim como seus irmãos, mas isso obviamente não contradiz o fato que muitos estão abalados psicologicamente em Sderot e no Otef Gaza".
Não estão fartos de viver assim?
“Isso definitivamente nos deixa fartos, mas estar fartos não é como um plano de trabalho, o medo e a raiva não são um plano de trabalho. A pergunta é o que nós precisamos fazer para que nos permitamos seguir felizes. Precisamos continuar a cuidar da segurança, por distintos meios, tal como uma proteção ativa e passiva”.
“Bilhões de shekels foram investidos nos últimos anos para a defesa ativa e passiva de Sderot e do Otef Gaza. Precisam continuar com esses programas de governo profundos de desenvolvimento e fortalecimento de Sderot e do Otef Gaza, e o mais importante - só ultimamente o governo tem feito isso -, uma experiência verdadeira e contínua no canal diplomático. Ou seja, usar as nossas influências diplomática, gerais e militares para dobrar a liderança do Hamas em Gaza e forçá-la a preocupar-se com seus próprios habitantes, e obviamente com a nossa segurança”.
Eu espero que o cessar-fogo seja por um longo período, que inclua todos os tipos de terror, como pipas, e desde que haja uma estrutura dentro do cessar-fogo que vise criar um mecanismo para impedir o fortalecimento do Hamas, porque nós sabemos o que acontece durante o cessar-fogo e o que aconteceu desde a (Operação) Margem Protetora até hoje”, disse Idan.
"Nós não queremos guerra, mas se não há escolha, então nós esperamos, por outro lado, que seja uma ação forte e agressiva, que mudará as regras do jogo e que devolverá o recuo que houve desde a (Operação) Margem Protetora até o último período para o Estado de Israel, que restaurará a tranquilidade por mais alguns anos e nos permitirá continuar crescendo”.
Nota do tradutor
A ideia é mostrar, por meio da mídia israelense, como os habitantes das regiões mais afetadas pela escalada de violência e risco de guerra iminente se sentem, pensam e se preparam para o que virá.
No "Lado B", o leitor poderá ter acesso à tradução de uma reportagem feita com moradores palestinos da Faixa de Gaza. Clique aqui e leia.
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