Pesquisa: aumento no número de casamentos de judeus em Israel alternativos ao rabinato
De acordo com a pesquisa, que monitora o número de casamentos por meio de cerimônias privadas em Israel, em 2017 foram realizados ao menos 2.434 casamentos privados entre judeus em Israel. Dois a cada três desses casais são reconhecidos como judeus pelo rabinato.
Judy Malz - 13/06/2018 - Haaretz
Tradução livre de João Koatz Miragaya
Cada vez mais casais judeus decidem casar-se em Israel em marcos externos ao rabinato - assim foi divulgado pela primeira pesquisa do gênero, divulgada recentemente e compartilhada com o (jornal) Haaretz. Na pesquisa “Panim - Associação de Organizações de Judaísmo Israelense”, houve um aumento de 8% no número de casamentos em 2017. No entanto, cabe ressaltar que é impossível medir com precisão o total de casamentos por não haver uma organização que documenta todos os casamentos, e não há registro organizado dos casais no Arquivo Populacional.
A pesquisa aponta para pelo menos 2.434 casamentos realizados em marcos externos ao do rabinato em Israel, e se baseia em entrevistas com pessoas que realizaram as cerimônias e com membros de organizações que realizam casamentos em marcos externos ao rabinato. Tais cerimônias não são reconhecidas pelo Estado, mas o Estado é obrigado a registrar os casamentos realizados no exterior - uma solução complementar escolhida por muitos casais.
Aproximadamente 55% dos casais que realizaram cerimônias de casamento privadas e estão incluídas na pesquisa, são judeus seculares que vivem na região metropolitana de Tel-Aviv - em paralelo à diminuição do número de casais que se registrados pelo rabinato. Cerca de dois terços desses casais eram aptos a casar-se por meio do rabinato. Aproximadamente 8% são casamentos homoafetivos, e 4% são Psulei Chitun - entre outros, bastardos e casais divorciados que voltaram a viver juntos.
A pesquisa expõe um outro fenômeno, que é o fato de cada vez mais rabinos ortodoxos executarem cerimônias externas ao marco do rabinato. De acordo com a pesquisa, ao lado de rabinos conservadores, reformistas e outros mestres de cerimônia independentes, os rabinos ortodoxos empreendem cerimônias (privadas) de casamento, embora não tenham permissão legal para realizar cerimônias privadas e podem até ser sentenciados a até dois anos de prisão por realizá-las. De acordo com as informações,m (em 2017) 14 rabinos ortodoxos realizaram 150 casamentos privados em Israel, mas até agora nunca nenhum rabino ortodoxo foi punido por empreender cerimônias como estas.
Os casais que realizaram cerimônias privadas não foram registrados no rabinato, e não realizaram suas cerimônias na presença de um representante autorizado, conforme necessário, e, portanto, a cerimônia não é suficiente para registrar o status do casal como “casados” em Israel. Abrir mão do rabinato em um casamento também pode livrar o casal de lidar com ele em caso de divórcio. Casais que realizam suas cerimônias de casamento civil no exterior e registram seu casamento em Israel ao retornar, precisam passar pelo rabinato em caso de separação. Michal Berman, diretora da organização “Panim”, explica que a razão do aumento dos casamentos privados em Israel é devido ao fato de que os casais “desejam que suas famílias estejam presentes na cerimônia, e preferem economizar os custos de viajar para o exterior”.
De acordo com a pesquisa, no passado, a maioria dos casais seculares israelenses que se casaram em marcos externos ao rabinato, o fizeram por “fervor ideológico”, enquanto nos últimos anos aparentemente a decisão é uma expressão de estilo e valores individuais. Apesar do desvio da norma, aparentemente a maioria dos israelenses seculares incluem em seus casamentos privados elementos judaicos tradicionais, como as bênçãos e a quebra do copo, mas tendem a ser mais igualitários que as cerimônias ortodoxas. Segundo a pesquisa, falantes do idioma russo preferem realizar suas cerimônias no estilo ortodoxo, e parte deles exigem que este seja dirigido por um rabino.
A pesquisa frisa que cerca de 400 mil israelenses, em especial imigrantes da ex-URSS e seus descendentes, não podem casar-se em Israel devido ao fato de que não são considerados judeus pelo rabinato. Segundo Berman, “o Estado de Israel criou uma situação absurda na qual centenas de milhares de seus cidadãos são privados do direito básico de casar-se. Enquanto o rabinato está ocupado com detalhes ‘cosméticos’, o público toma o seu caminho e opta por casar-se por meio de casamentos judaicos dignos e respeitosos”.
“Panim” é uma associação formada por dezenas de organizações israelenses sem fins lucrativos, que promovem o judaísmo pluralista no país, e que divulgou tal pesquisa sob a orientação de Chaguit Hacohen Wolf, diretora do Centro Sapir de Cultura e Educação Judaica. A pesquisa vem de uma iniciativa da IREP, a Federação Judaica da América do Norte, cujo objetivo é promover o pluralismo religioso em Israel, e indica que provavelmente que o número de casamentos realizados fora da estrutura do rabinato em Israel é muito maior do que o que mostra a pesquisa. No entanto, Yotam Brom, chefe da pesquisa e membro da organização Panim, diz que "a pesquisa apresenta um banco de dados que será um padrão e uma fonte para comparação para estudos futuros".
Nota do tradutor
Há quatro anos eu e minha esposa nos casamos em Israel, de forma externa à estrutura do rabinato. Decidimos que o judaísmo ortodoxo não representava o nosso judaísmo, e, ainda mais importante, que o monopólio do rabinato sobre as leis civis era uma afronta ao nosso sionismo, democrático, plural e progressista. Optamos por escrever nossa própria cerimônia, e dá-la a nossos irmãos para que a conduzissem. Decidimos que não queríamos nem mesmo um rabino reformista, conservador ou laico - sim, isso existe em Israel e em breve chegará ao Brasil também, podem esperar! - porque nenhum rabino em Israel fazia parte das nossas vidas a ponto de que decidíssemos dar-lhe um papel tão importante assim. Convidamos nossos melhores amigos para sustentar a chupá e ler brachot (bênçãos) que eles mesmos escreveram. Demos nosso significado a cada parte da cerimônia. E não registramos patente (ou seja, qualquer um pode fazer isso de graça).
Foi uma cerimônia muito emocionante, para mim. Não foi um ato político, foi um ato de amor cuja maneira de expressá-lo foi decidida por nós, não por um conselho de religiosos. Posteriormente, fizemos como muitos israelenses e nos casamos no civil no Chipre, e o registramos em Israel. A cerimônia civil cipriota também era muito bonita, igualitária e, por mais que tenha sido realizada por um estranho, nos agradou.
Meu casamento provavelmente não apareceu em nenhuma estatística da Associação Panim, pois não fizemos em parceria com nenhuma organização. Eu, particularmente, fiquei muito satisfeito com a nossa cerimônia, mas gostaria que o Estado de Israel nos desse a opção de uma cerimônia civil, ao estilo sionista, de podermos realizar nosso casamento evocando a valores como liberdade, igualdade e amor. Quem sabe essa movimentação de israelenses seculares não ajuda a adiantar esta causa?
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