Ao final de uma guerra, sempre discute-se quem saiu vitorioso. Os governos precisam prestar contas em casa, tentando mostrar para a população que os gastos astronômicos com foram por uma causa justa. Também precisam mostrar competência e capacidade na defesa e proteção de Israel. As vozes são muitas dentro do governo israelense e há opiniões diversas de como a operação “Margem Protetora” deveria ter sido executada.
O argumento inicial quando a operação começou era de que os ataques aéreos seriam feitos até que os mísseis parassem de cair em Israel. Depois da infiltração de terroristas do Hamas por um túnel, a entrada por terra aconteceu e o argumento oficial para a guerra passou a ser a destruição dos túneis do Hamas. Mesmo assim, havia membros do governo que defendiam até a reocupação de Gaza. Já no final da operação, com o início do primeiro cessar-fogo de 72 horas, críticas à condução da operação também apareceram, com setores do governo dizendo que Israel deveria acabar com o Hamas e que não poderia aceitar o cessar-fogo.
Desde o início, a posição oficial do governo deixava claro que não havia a intenção de acabar com o Hamas. A destruição dos túneis daria a legitimidade necessária dentro da sociedade israelese para a operação e, ao destruir todos os túneis conhecidos, o governo decide partir para o cessar-fogo e retira as tropas de Gaza. Muitos cidadãos israelenses que moram na região fronteiriça com Gaza se mostraram insatisfeitos com o cessar-fogo, dizendo que isso não resolveria o problema e que em pouco tempo a guerra seria novamente uma realidade em suas vidas.
Será que o cumprimento da missão, a destruição dos túneis, faz de Israel vitorioso nessa guerra? Houve um real revés na estratégia e na política do movimento fundamentalista palestino? O Hamas não é um movimento de loucos raivosos, ávidos por poder. O Hamas tem tática, estratégia e objetivo. O Hamas joga em diferentes frentes e vem conseguindo um êxito enorme. O objetivo do Hamas é a destruição de Israel e a construção da Palestina em todo o território da chamada “Palestina Histórica”, do Rio Jordão ao Mar Mediterrâneo. Sua Jihad mira a restituição da Shaaria (código de leis morais e religiosas do Islã) nesse novo país e subjugação de todos à sua forma de governo e religião. Já a sua estratégia ficou muito clara nesse último conflito. O Hamas sabe que não vai derrotar Israel militarmente. Utiliza táticas de guerrilha contra um exército extremamente bem equipado. As duas principais frentes do Hamas são: a destruição da democracia israelense e a deslegitimação de Israel.
E a tática? Ora, a tática é o terrorismo, a guerra. Mas antes que eu parta para a análise, só queria ressaltar que para que haja guerra, é preciso que tenha um outro lado disposto a guerrear. Durante a operação militar houve uma efervecência muito grande dentro da sociedade israelense. Na verdade, mesmo antes, a partir do sequestro dos três jovens israelenses, ocorreu um movimento extremamente perigoso levando a pedidos de vingança contra a população árabe (que na minha opinião foi expressa no formato de guerra, como apontei em meu último artigo), perseguição a moradores de Jerusalém Oriental e, principalmente, a uma deslegitimação da própria esquerda israelense.
Ser a favor da paz e do diálogo e contra a guerra passou a ser motivo de agressões físicas (em casos de manifestações do gênero onde militantes tentavam impedir tais protestos na base da violência) e agressões verbais (quando discute-se política em diversos ambientes). Houve uma radicalização à direita,a perpetuação do ódio. O medo de um possível extermínio e um suposto mega ataque terrorista que seria praticado na noite de Rosh HaShana, o ano novo judaico, conforme anunciado pela mídia israelense. A democracia israelense começa ser colocada contra a parede e as consequências da guerra e do longo conflito começam a aparecer de forma mais reacionária e autoritária.
A “crucificação” de movimentos de esquerda que gritam pela paz e a fortificação de quem defende a guerra. Uma vitória para o Hamas. A deslegitimação de Israel é a segunda estratégia do grupo terrorista para se construir o Estado palestino. Não é nem preciso avaliar as consequências da missão “Margem Protetora” pelo mundo. Do antisionismo ao antissemitismo, manifestações tomaram as ruas de diversas cidades. Protestos em frente a embaixadas e sinagogas, judeus sendo atacados como se fossem responsáveis pela guerra em Gaza.
No campo diplomático, países chamam seus embaixadores em Israel para esclarecimentos e outros ameaçam com um embargo militar, ou seja, não forneceriam mais armamentos ao exército israelense. A estratégia do grupo terrorista para deslegitimar Israel passa pela morte da sua própria população. Mortes e destruição são o que o Hamas quer, pois isso fortalece a sua Jihad midiática. Os mortos são mártires que serviram à luta contra a legitimidade de Israel. O objetivo maior é o que importa. Os fins justificam os meios. Outra vitória do Hamas.
As manifestações e o isolamento político de Israel são as maiores provas de que eles estão no caminho certo. Agora, a maior vitória do movimento terrorista está prestes a acontecer. O cessar-fogo indeterminado, pelo fim da guerra, mediado pelo Egito, deverão manter o Hamas como a principal força política em Gaza. O quem vinha sendo discutido e reivindicado são medidas tão básicas, como o fim do bloqueio à Gaza (livre trânsito de pessoas e mercadorias) e construção de um porto, que o governo de Israel poderia ter feito isso através de negociações com o governo palestino antes de que a guerra começasse.
A guerra trouxe o Hamas e outros grupos terroristas para o centro do cenário político. Qualquer acordo terá que passar pelo aval desses grupos. A Jihad do Hamas não se constrói somente no campo militar. É muito maior que isso. A guerra significa dar um passo atrás para depois dar dois para frente em seguida. Eles precisam da guerra e contam com a ajuda do lado israelense para atingir seus objetivos.
Artigo publicado em 27 de agosto de 2014
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